Reprodução: Danilo Fernandes

Insatisfeitos, conectados e divididos: por dentro da polarização

Entenda porque a intensificação de atitudes radicais revela uma divisão presente muito além das urnas

Por Lucas Campêlo

30/11/2020 - 09:00

SÃO PAULO — Os traços econômicos das cidades brasileiras evidenciam profundas desigualdades que permeiam nosso cotidiano. Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019, um décimo da população brasileira concentrava 43% dos rendimentos financeiros mensais produzidos em todo país. César Sampaio, professor na rede pública estadual de São Paulo e historiador, declara que há um fosso econômico dividindo a sociedade brasileira. Para Daniel Gomes, doutor em história social pela Universidade de São Paulo (USP) e professor na Universidade de Brasília (UnB), as diferenças no Brasil vão além da questão econômica, alcançando fatores raciais e sociais como questões de gênero.

Segundo Daniel, existem momentos de crise em que essas desigualdades tornam-se notórias e impossíveis de serem ignoradas. “A crise é um momento crítico no qual as tensões ocultas da nossa sociedade tornam-se evidentes”, explica. O candidato a vereador em São Paulo pelo PSOL, Renato Assad, defende que é nesse período de crise e de desigualdades acirradas que o fenômeno conhecido como polarização ocorre. “Quando você tem uma crise, começam a aparecer contradições da vida cotidiana. Então, surge uma polarização acerca das interpretações da realidade que vão propor uma saída para a crise pela esquerda ou pela direita”, diz.

“Existem polarizações em diferentes intensidades, que podem levar a discussões saudáveis, guerras ou conflitos étnicos e sociais. Todas elas aparecem em períodos de crise”, defende Renato. Para ele, o nível de “barbárie” presente em uma sociedade define qual caminho a polarização irá seguir, seja o de aprimorar o debate democrático ou favorecer o extremismo.

Ilustração sobre polarização politica
Créditos: Hoshi

“Ao mesmo tempo em que o debate de ideias é bom, ele pode nos levar a lugares errados”, declara o professor César Sampaio. Segundo ele, um tipo de debate marcado por oposição e adjetivação e a inexistência do diálogo são características comuns dos momentos de polarização. “Há épocas onde os partidos discutem em uma mesma linha, discordam em um ponto ou outro, mas a polaridade acontece quando há visões completamente opostas de projetos que nos levam a um ponto onde não há diálogo”.

De acordo com a pesquisa Satisfaction with Democracy, realizada em 2019 pelo centro de investigação Pew Research Center, há um sentimento de descrença em relação ao poder da política e da democracia crescendo entre os cidadãos do Brasil. Segundo o levantamento, 56% dos brasileiros estão insatisfeitos com a forma pela qual a democracia funciona. Na média mundial, a porcentagem de pessoas insatisfeitas com o sistema também ultrapassa os 50%. "Há uma queda acentuada na crença do poder da política de transformar as coisas e uma insatisfação geral com o modelo político no mundo”, diz César.

Para Daniel Gomes, as sociedades tendem a reagir de forma semelhante durante os períodos de polarização. O professor enfatiza que outros grupos na história já optaram por flertar com raciocínios extremistas durante momentos de crise, seguindo pelo caminho da oposição arbitrária e negando saídas pelo diálogo ou por soluções democráticas. “Foi o caso da Itália de Mussolini e da Alemanha de Hitler, que na busca pelo fim do período de caos, apoiaram a ascensão do totalitarismo”, afirma.

Caminhos no Brasil

Segundo Daniel , há uma guerra de “nós contra eles” enraizada no Brasil muito antes das eleições dos governos petistas ou da ascensão do atual presidente Jair Bolsonaro, que são os protagonistas dos conflitos políticos dos últimos 20 anos. Gomes propõe a ideia de que existiram diferentes formatos de polarização no Brasil, como por exemplo, os confrontos ideológicos entre senhores e escravos no período colonial. “O que eu quero dizer é que o nós-contra-eles vem de muitos anos na história do nosso país".

Rosinei Naves, mestre em História Econômica pela USP e professora na Universidade São Judas Tadeu (USJT), afirma que a polarização brasileira é um fenômeno que pode ser notado desde os tempos do império e que as marcas profundas que vemos nos dias de hoje são resultado das diferenças e desigualdades que se difundiram desde então. “Uma das consequências mais predominantes é que, no Brasil, uma parte da sociedade se curvou a uma elite mundial e manteve a cultura escravocrata entre nós’, diz.

“Será que a polarização no Brasil foi inventada nos últimos vinte anos pelos políticos?” - Daniel Gomes

O professor César Sampaio defende que os conflitos que vivemos hoje derivam, em grande parte, de acontecimentos internacionais do século XX, como a Revolução Industrial, a Revolução Russa de 1917 e a Guerra Fria. A noção que as pessoas possuem hoje em dia sobre capitalistas, comunistas e socialistas (termos muito usados nos debates públicos) foi herdada destes momentos, conforme explica. “O que acontece hoje é praticamente um retorno às ideologias da Guerra Fria”. Até mesmo a pejoratividade e o preconceito existente a respeito destes termos é uma herança de conflitos passados, como elucida César. “Achávamos que depois da queda do muro de Berlim isso iria morrer. Até ficou escondido por um tempo, mas hoje, existe uma retomada de discussões semelhantes. É interessante como a gente volta a discutir coisas que eram do século passado”, reflete o professor.

Daniel Gomes também acredita que o atual cenário de polarização no Brasil é uma consequência das contradições políticas petistas dos anos 2000, que não estabilizaram o parque industrial do país e priorizaram um crescimento da classe trabalhadora focado apenas no consumo, e não no fortalecimento da renda. “Há sim coisas em comum com os séculos passados, mas não podemos esquecer que o momento atual deriva, em grande parte, das próprias contradições da última década”, diz. “Precisamos tomar cuidado para não esquecer o que é próprio do nosso tempo”.

Reprodução: Naoyuki Toyama

Ondas e marés: instabilidade política na América do Sul

Por Ester Santana

A polarização não é um fenômeno recente. Nos países do continente sul-americano, diversos movimentos políticos e econômicos ao longo das últimas décadas conduziram à ela. Para entender o cenário polarizado atual, é preciso retornar aos anos 90, quando governos autoritários e neoliberais foram substituídos por novas forças políticas. Era o começo da chamada Onda Rosa, período em que lideranças de esquerda subiram ao poder em toda América do Sul.

Para Marcelo Coutinho, pesquisador e coordenador do Laboratório de Estudos da América Latina (LEAL) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a ascensão de governos “mais à esquerda” na América do Sul “foi propiciada por um esgotamento natural dos governos anteriores” e seguida por uma “sequência de expansão e crises econômicas”.

Entre 2003 e 2008, o cenário internacional passou a se mostrar mais favorável para as economias sul-americanas, que se inseriram no mercado de matérias-primas exportando produtos como soja, trigo, cobre, petróleo e ferro. Nesse período, o continente atravessou o chamado superciclo das commodities agrícolas e minerais.

Ilustração sobre polarização politica
Créditos: Hoshi

Além disso, os países da América do Sul também se aproximaram mais da Ásia, construindo relações comerciais, principalmente, com a China. “A aproximação da Ásia por parte das economias sul-americanas se deu pela volta das relações de dependência”, explica Marcelo Coutinho. Por meio dessa relação, os países exportadores de produtos primários deslocaram o eixo do comércio exterior para o gigante asiático.

O resultado dessa exuberância econômica foi visto e sentido. Houve um aumento generalizado do bem-estar e aceleração das taxas de crescimento, com redução da pobreza e da desigualdade de renda em todo continente. Como consequência, governos de diferentes ideologias puderam gastar mais do que seus antecessores, contribuindo para produção de mais empregos e melhores salários.

“O superciclo chinês trouxe benefícios, mas também colapsou os governos de esquerda ao provocar uma forte desindustrialização nos países”, afirma Coutinho, referindo-se ao resultado das relações de dependência, que ocasionou uma forte queda no nível da produção industrial, com uma menor participação das indústrias no Produto Interno Bruto (PIB) de seus países. “O desencantamento acontece quando as commodities caem e o lado negativo da dependência vem à tona, quando então também surgem escândalos de corrupção recordes que levam à desilusão popular”.

Fim de um ciclo, e as dores dessa perda

A partir de 2011, quando todos os países da América do Sul, com exceção do Chile, eram liderados por presidentes de esquerda, uma reversão do cenário econômico próspero entrou em curso. Contudo, os desdobramentos dessa reversão, com a piora das condições de vida, não foram sentidos de imediato.

Apesar de fatores externos terem gerado a crise, tanto no Brasil quanto nos demais países da região, circunstâncias domésticas foram responsáveis por acirrar o descontentamento da população. Uma série de problemas ainda não resolvidos como desigualdade, violência e corrupção fizeram com que as expectativas de milhões de sul-americanos, que buscavam consolidar sua ascensão à classe média, fossem frustradas.

Revoltas, manifestações e agitações marcaram o fim de um ciclo na América do Sul: foi o começo da Maré Azul, nome dado ao expressivo levante dos governos de direita, com tendências mais conservadoras e neoliberais, em contraposição aos governos anteriores.

Em 2015, após a vitória do candidato argentino de centro-direita, Mauricio Macri, diversas lideranças políticas de direita também subiram ao poder no Chile, Colômbia, Peru e no Brasil, consolidando a tendência de mudança de governos no continente sul-americano.

“Essas forças da direita conservadora sempre existiram, mas haviam perdido força a partir do fim da segunda guerra mundial e no período da redemocratização”, afirma Giovana Zucatto, pesquisadora do Observatório Político Sul-Americano (OPSA) ligado ao Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). “Esses grupos conseguem enxergar uma janela de oportunidade para voltarem a ocupar o poder, especialmente com a crise econômica e os escândalos de corrupção”, diz.

Pautas em que a esquerda foi incapaz de apresentar soluções satisfatórias como a busca por renovação política e maior firmeza no combate à corrupção se transformaram em questões centrais para a direita sul-americana. “O avanço da direita como um todo puxou o debate político para o âmbito da corrupção e fez amplo uso da judicialização da política”, elucida Zucatto. Esse crescimento, segundo a pesquisadora, está ligado a um contexto maior, no qual lideranças políticas globais têm defendido discursos nacionalistas e identitários, em reação “aos avanços dos grupos sociais historicamente marginalizados”.

“As principais características da direita sul-americana são o conservadorismo em termos de moral e costumes, posturas antidemocráticas bastante totalitárias e apelo à militarização”, aponta Zucatto. “Especialmente em relação ao último, cabe ressaltar o papel que os militares das Forças Armadas e policiais têm desempenhado na ascensão e manutenção desses grupos no poder”, afirma.

Foto de Protesto

Ondas da polarização e seus efeitos

Nesse cenário, a polarização figura como uma forma de racionalizar os fatos. “Ela é uma maneira de diferenciar opiniões, posicionamentos políticos e projetos de sociedade. Serve para a construção de um horizonte ético, quando distintas leituras, morais e propostas se antagonizam”, explica Fábio Ortolano, doutor em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (USP), integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Política, Políticas Públicas e Multiculturalismo da USP. “Contudo, quando levada ao extremo, a polarização se torna limitadora, pois a realidade e a sociedade são mais complexas”.

Para o cientista social e professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), Felipe Corrêa, no Brasil atual, a polarização é resultado da politização de uma sociedade que não estava educada para a política. “Essa polarização se dá de uma maneira muito grosseira, pouco profunda do ponto de vista político e resulta nesse caos, em que as pessoas se envolvem, mas levam para a política um comportamento religioso, comportamento de torcida de futebol”, diz Corrêa. “Quando se entra para a política com esse espírito, fica muito mais um jogo de torcida do que qualquer outra coisa”.

Fábio Ortolano, doutor em psicologia social, defende que as relações sociais e as instituições das quais os indivíduos participam influenciam na identificação com determinada ideologia ou bandeira política. Por isso, “é preciso levar em conta múltiplas variáveis a fim de compreender fenômenos políticos e sociais, pois uma única lente não é suficiente para enxergar todas as partes”, aponta. “Para mim, a maior consequência da polarização é o reducionismo, responsável por naturalizar e cristalizar alguns processos, realidades, coisas e pessoas muitas vezes. Desse modo, deixamos de lado o pensamento complexo, uma leitura holística, e passamos a agir e interpretar as coisas pelas emoções, estigmas e preconceitos.”

Ilustração sobre polarização politica
Créditos: Hoshi

Dissenso intolerável

Os indivíduos não possuem opiniões unânimes, estáticas, indivisíveis. Pelo contrário. Inúmeras vezes as diferenças entre os sujeitos não permitem um consenso entre as partes, mesmo que seja para o bem de todos. Porém, como explica Daniel Gomes, doutor em história social pela USP e professor na Universidade de Brasília (UNB), é na democracia que as divergências políticas podem ser expressas publicamente, pois nesse sistema o conflito é considerado legítimo. “É preciso que as pessoas tomem cuidado ao criticar a polarização como uma coisa ruim, pois ela é inerente à democracia. Alguns graus de diferenças, as formas de polarização, de contextos e debates são inerentes à própria ideia democrática”, explica.

O problema da polarização não está nas diferentes visões que uma pessoa é capaz de ter sobre um tema, mas sim, no fato de que ela pode fazer com que questões verdadeiramente importantes sejam deixadas de lado. “As pessoas estão se enfrentando, tanto de um lado e do outro dos polos, quanto dentro dos polos, sem enfrentar as grandes questões do Brasil contemporâneo”, analisa o cientista social Felipe Corrêa. “O que temos hoje é uma briga partidária entre esquerda e direita. É, por exemplo, a defesa do porte de armas, enquanto o problema da segurança pública, estudado de modo sério e aprofundado, é ignorado”, diz.

Segundo o professor Daniel Gomes, ao longo da história, o ocidente já experimentou outros momentos de polarização que dividiram famílias e romperam relacionamentos, como foi, por exemplo, o confronto entre católicos e protestantes durante a Reforma Protestante. “Parentes se estranharam e vários estranhos se irmanaram. É isso que as polarizações costumam fazer na história. Os diferentes passam a se assemelhar, criando novos tipos de associações, e antigos tipos de associações são desfeitos”, explica Gomes.

No caso da história recente do Brasil, o atual cenário polarizado tem remontado esse quadro, muitas vezes se configurando como um fenômeno inédito para as novas gerações. “A polarização, tal qual estamos vivendo, invadiu a vida privada. Quem é mais jovem, ainda não havia visto essa invasão pela questão política no Brasil”, analisa o professor. “Hoje, a maioria das famílias tem alguma divisão. Se eu tiver algum problema financeiro, por exemplo, é mais fácil pedir dinheiro para um amigo do que para familiares muitas vezes. Isso devido a esse estranhamento que vem da polarização. O impacto nas relações é bastante profundo”, completa Gomes.

De acordo com o pesquisador Fábio Ortolano, a polarização extrema produz um ambiente hostil e faz as pessoas se fecharem para o diálogo e a tolerância. “A cientista política Chantal Mouffe fala da democracia como espaço do dissenso, não apenas do consenso. Nós precisamos saber discordar. O outro pode ser um antagonista, não um inimigo que eu devo eliminar”, diz Ortolano.

Para o professor Daniel Gomes, a polarização não será plenamente solucionada pelas vias políticas. “A via política é muito importante, precisamos fortalecer as instituições democráticas, a igualdade perante a lei, precisamos acabar com política de compadrio, do “você sabe com quem está falando”. Não digo que o campo político não é importante. Ele é fundamental”, reflete. “Contudo, o que ficou claro após 30 anos de Constituição é que não basta ter uma lei para resolver o problema. Não iremos solucionar o problema da polarização sem antes resolvermos o problema da miséria e da desigualdade social em suas mais variadas formas”, afirma Gomes.

Ilustração sobre polarização politica
Créditos: Hoshi
Reprodução: Peter Vilanova

Ciber polarização: conflitos tecnológicos

Por Letícia Remonte

Em 2013, as redes sociais se consolidaram como o principal meio de organização política, figurando como um importante meio para divulgação de informações sobre as manifestações. O Facebook foi o maior agente de comunicação virtual nesse cenário, com uma grande quantidade de eventos, fóruns e páginas voltadas aos atos. Os acontecimentos desse período foram tão marcantes que continuam repercutindo na política nacional até os dias de hoje.

“A política atual ainda sente o impacto das Jornadas de Junho”, diz o professor e pesquisador da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Fábio Monteiro. Seguindo a teoria do filósofo e doutor em Teorias Literárias Francisco Bosco, Fábio afirma que o evento precisa ser visto sempre em retrospectiva. Ele defende que três grandes pilares foram abrangidos pelas manifestações: a crise do Lulismo e o início da queda petista; a crise na cultura, referente a falta de debate político por meio da expressão cultural; e a entrada das redes sociais no sistema político brasileiro.

O professor cita as Jornadas como essenciais para a efervescência da polarização. “Houve um aumento do fenômeno a partir de junho de 2013. Nos últimos sete anos, ela tem se acentuado cada vez mais, seja por questões econômicas, políticas, partidárias ou, sobretudo, pela pauta de costumes”, afirma.

Foto de Protesto
Jornadas de Junho 2013. Reprodução: Tiago Queiroz.

Fábio destaca o papel das redes sociais como propulsoras desse cenário a partir da criação de situações de relevância de opinião de forma ilusória. Por isso, as expressões de críticas políticas ocorrem de forma tão intensa, já que os usuários sentem que através da plataforma seus pensamentos e atos são mais importantes do que os de outras pessoas. “As redes sociais trouxeram novas motivações, sentidos e determinações de tendências de comportamento”.

“Elas criam a ilusão de que o que falamos, o que pensamos, as nossas opiniões são efetivamente importantes. Elas têm um apelo psicoafetivo, alimentam a nossa necessidade de reconhecimento social.” - Fábio Monteiro.

Ele finaliza refletindo sobre o papel dos youtubers e digital influencers na política brasileira. Para Fábio, esses profissionais se sentem aptos a falar com mais normalidade sobre pautas de costume, como questões de gênero e posições políticas, por abordarem temas atuais na internet. A política, encaixada nessas pautas, atua nos outsiders, ou seja, pessoas que não são adeptas da política exercida de modo tradicional, ou não se sentem representadas pelos políticos atuantes.

Algoritmos: escalada das fake news

A pesquisadora e advogada do centro de pesquisa em direito e tecnologia Internet Lab, Heloisa Massaro, afirma que a internet mudou a maneira de comunicação e, consequentemente, a forma de se fazer política: se antes as campanhas eram marcadas pelo horário eleitoral gratuito, hoje, a internet permite que mais pessoas passem a fazer parte do debate político simultaneamente. “Os algoritmos desenham o que pode ser mais relevante para o usuário, isso traz novos elementos na forma de campanhas políticas no âmbito virtual”, explica.

Segundo ela, a instantaneidade dos meios digitais e a possibilidade de receber conteúdos de qualquer usuário intensificou a prática das fake news, movimento que Heloísa prefere nomear como “desinformação”. As chamadas “Campanhas em Formato de Rede” se popularizaram e deram voz a apoiadores, democratizando a disseminação de opiniões, que são distribuídas em formato noticioso. “A informação deixa de ser controlada pela mídia de massa e se torna instrumento para usuários que são agentes de circulação de conteúdo. Assim, a notícia não é mais necessariamente produzida sobre os imperativos do jornalismo, podendo ser completamente inventada”, diz.

Renato Assad, fundador do portal Esquerda Web, relata que a principal dificuldade de se fazer política na internet em um cenário polarizado é lidar com a grande quantidade de notícias falsas. “A polarização intensifica o debate, intensifica a disputa, mas por um lado, ela também pode banalizar a discussão política pelas fake news”, afirma.

fake news - eleições 2018

O jornal El País monitorou 272 grupos de whatsapp disseminadores de notícias falsas no período eleitoral de 2018

Polarização: lado esquerdo

Devido à recente ascensão de lideranças políticas de direita no Brasil, os simpatizantes dos representantes de esquerda precisaram reafirmar seus ideais de forma mais explícita. Assim surgiu o Esquerda Web em junho de 2019, um portal aberto para textos jornalísticos colaborativos com domínios ao redor do mundo, em países como França, Argentina e Espanha.

Renato Assad, de 28 anos, fundador do projeto e filiado ao PSOL-SP, conta como o portal atua. “A ideia era fazer esse site justamente para poder abrir a discussão, se apropriar do meio virtual e encaminhar uma construção política organizativa aqui no Brasil”. Por conta disso, ele afirma receber mensagens de ódio nas redes sociais do Esquerda Web. “A primeira coisa que vem são caracterizações banais que deixam de lado qualquer possibilidade de debate político sério e se atentam a rótulos: ao comunista, ao vagabundo, ao gayzista que quer transformar nossas crianças em sei lá o que”.

O cientista social e professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), Felipe Corrêa, explica que na mesma medida em que as redes sociais permitem aos indivíduos se manifestarem mais, elas servem para reforçar comportamentos fanáticos e ideológicos. “Como consequência dessa polarização, surgiram muitos espaços que têm conseguido dar respostas a esses vínculos, desde igrejas universais até grupos políticos de internet”, explica.

Polarização: lado direito

Nicole McLean é australiana e autora de uma tese de doutorado na Universidade de Brisbane, sobre discursos de movimentos da direita brasileira nas redes sociais. Para ela, esses movimentos são divididos em dois setores: a parte política e a parte midiática. Ela expõe essa divisão quando relata que o Movimento Brasil Livre (MBL) produziu conteúdos informativos enviesados para as mídias digitais. “No início de 2017, o MBL criou um segmento chamado “MBL News”. É uma réplica, uma espécie de Jornal Nacional, que ocorre diariamente, ao longo da semana. Lá, eles dão a opinião deles sobre notícias políticas, essa é uma das características de mídia do movimento”.

A doutoranda também cita o movimento “Nas Ruas”, protagonizado pela deputada federal Carla Zambelli (PSL). “Esse movimento sempre publicou muitas notícias. Desde 2017, tem bastante posts, lives e memes pró-Bolsonaro nas redes sociais do Nas Ruas.” Para Nicole, isso teve clara influência na eleição do então pré-candidato presidencial, Jair Bolsonaro, em 2018.

O vereador de Carapicuíba pelo PSDB, Fabinho Reis, destaca a rapidez de Bolsonaro em se adaptar e fazer política nas redes sociais. “Ele usou muito bem as ferramentas das redes e postagens de vídeos. É até meio amador, mas é uma coisa que a população gosta. O Bolsonaro captou a mensagem, utilizou isso na campanha e continua usando para governar”.

Reprodução: Fernando Correia

Rostos que dividem o Brasil

Por Stephanie Fazio

“Ocupar e resistir!”. Esse era o grito que impulsionava os militantes que desciam a Av. Higienópolis (SP) com pedaços de pau nas mãos em 31 de agosto de 2016, data em que a ex-presidente Dilma Rousseff sofreu o impeachment. “Quando a manifestação estourou, tinha um carro da polícia vindo em direção à Brigadeiro. Mas, do nada, o carro entrou dando cavalinho de pau no meio dos manifestantes, quase atropelou todo mundo e saíram [os policiais] atirando e tacando bomba”, relembra Manuela Abreu, advogada e militante de esquerda de 24 anos.

Segundo a advogada, que estava acompanhada de suas amigas Carolina Siqueira e Marcela Tolosa, ambas advogadas de 24 anos, a polícia militar já estava a postos, antes mesmo do ato, que tinha como ponto de partida o Museu de Arte de São Paulo (Masp), se iniciar. “Foi muito violento, mas com uma resistência muito grande”, conta.

Em 13 de junho de 2013, José Roberto Castro, jornalista de 32 anos que cobriu as manifestações pelo jornal O Estado de S. Paulo, conta que estava andando pela Av. São Luís, quando tentou cruzar a Praça Roosevelt para ir até sua casa e notou a presença de fogueiras feitas com lixo. “Tinha um batalhão inteiro de policiais olhando para mim, que estava sozinho naquele momento: eu e 50 policiais de choque. Eu subi a Consolação, ali o cenário era de guerra”, descreve. Segundo Castro, a polícia foi violenta e, na Rua Augusta, houve muita repressão. “O que aconteceu naquele dia acendeu alguma coisa nas pessoas que não vão às manifestações, elas se sentiram revoltadas”, diz o jornalista.

O estudante de história Rodrigo Macedo, de 27 anos, também foi para as ruas em 2018. Nas redes sociais, o movimento de apoio ao então candidato à presidência Jair Bolsonaro estava no auge, assim como o antipetismo. “A forma de militância, de ir na rua e colocar a camisa amarela ou com a foto do Bolsonaro era algo novo, não era comum ter manifestação de direita no Brasil”, revela. Ele relata que logo após o atentado sofrido por Bolsonaro, em 6 de setembro de 2019, as pessoas foram com mais força para as manifestações.

Números dos contextos

“Teve uma fala do ex-secretário de transporte de São Paulo que dizia que o transporte público era um barril de pólvora para uma manifestação, e ele explodiu em 2013, porque esses movimentos conseguiram angariar muito apoio da população, principalmente da classe média”, afirma Rafael Ozório, professor de história de 35 anos.

Segundo Felipe Corrêa, cientista social e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), o que aconteceu no movimento de 2013, cuja marca principal foi o questionamento das instituições, foi a ampliação das pautas e uma participação muito significativa de vários setores da sociedade brasileira.

De acordo com o professor Ozório, a partir do momento em que as manifestações começaram a angariar muitas pessoas, houve uma divisão. De um lado, o Movimento Passe Livre (MPL) foi para a periferia, levando as manifestações para locais como Jardim Ângela e Capão Redondo. O movimento conseguiu um apoio maior das pessoas que moravam mais afastadas do centro e, consequentemente, sofriam mais com o aumento do preço do transporte público.

“A gente começou a ver outros movimentos mais conservadores aparecendo. Surgiram os grupos do Movimento Brasil Livre (MBL), formados também por uma classe média e uma classe média alta que acabaram tomando essa iniciativa de 2013, que sai da esquerda e leva ao impeachment da Dilma”, explica o professor de história.

Aproximações entre os militantes paulistas pró e contra o impeachment de Dilma Rousseff

fontes:empresa lean survey, 2016 e datafolha,2016.

Segundo Felipe Corrêa, cientista social, a polarização se constituiu entre 2013-2016. A direita assumiu um posicionamento único, mas havia dois campos dentro dela: um deles era o tucanato, somado a outros setores que não tinham expressão pública bastante conservadora. Aos poucos, um setor mais radical se desenvolveu nesse meio, tendo o antipetismo como elemento central da sua ideologia, o que culminou no bolsonarismo.

Na visão de Corrêa, por um lado, o PT estava perdendo poder, mas ainda se posicionando como um grande ator da esquerda. Surgiu, então, uma reação a esse crescimento da direita com a incorporação de outros setores de esquerda. Esse cenário acaba se tornando uma disputa entre duas forças. “É o antipetismo que faz essa polarização, é ele que constitui a direita dos extremos opostos”.

Essa linha do tempo busca pontuar algumas manifestações brasileiras que ocorreram de 2013 a 2020. Os critérios utilizados para a escolha das datas foram o número de manifestantes e a amplitude dos atos. Fontes: G1, El País, O Estado de São Paulo, Brasil de Fato, Veja, GZH Política e Uol.

Perfil dos militantes ao longo do tempo

Na opinião da advogada Manuela Abreu, em 2013, o perfil dos manifestantes era de pessoas mais jovens, na faixa dos 15 aos 35 anos, contudo, havia alguns mais velhos também. Segundo pesquisa divulgada pelo Datafolha em 20 de junho de 2013, 63% dos manifestantes eram homens e 39% eram mulheres. No quesito idade, a maioria tinha entre 26 a 35 anos. O levantamento também mostrou que 77% dos participantes tinham ensino superior.

“Já no final de 2014, dava para perceber que era um público à direita, conservador, mais velho e rico”, diz o jornalista José Roberto Castro. Manuela, que também participou das manifestações contra o impeachment de Dilma em 2016, relembra que a maioria do público era jovem. Porém, quando os atos eram convocados pelo PT, PSOL, por sindicatos ou pelo MST, eles eram mais plurais, abarcando pessoas de todas as idades.

O estudante Rodrigo Macedo, que participou das manifestações pró-Bolsonaro em 2018, relembra que nos atos de direita muitos jovens na faixa dos 20-27 anos estavam presentes, mas também havia pessoas mais velhas. “Tinham muitos jovens. A Avenida Paulista, por exemplo, estava lotada de gente de amarelo apoiando a Lava Jato, além de um forte clamor por mais segurança”, diz.

Quem eram os manifestantes de 2019?

* por serem itens distintos, a soma total dos dados ultrapassa 100%

Motivações

Choiti Kamikawachi, militante de 69 anos, conta que foi a indignação com os governos do PT, acentuada pela Operação Lava Jato, que o impulsionou a estar nas ruas. “Posso dizer que as minhas primeiras participações nas manifestações de rua foram a partir do movimento de impeachment da ex-presidente Dilma. Mentiras, arrogância e desrespeito à constituição eram práticas comuns neste governo”, afirma.

Hoje, de acordo com Choiti, quem mantém o presidente Bolsonaro no poder é o povo que o apoia, o que fica evidenciado nas manifestações e aparições em público. “A militância nesses momentos faz a diferença”, defende. O estudante de história Rodrigo Macedo também acredita que o ativismo é importante. “Um partido político tem muito mais força quando possui esse apoio. A militância é essencial tanto para um deputado poder difundir suas ideias, quanto para a população que quer reivindicar algo”.

O jornalista José Roberto Castro levanta um questionamento, afirmando que é necessário entender o motivo pelo qual as pessoas estavam tão insatisfeitas em 2013 e quietas em 2017, quando, segundo ele, a crise econômica e o desemprego estavam em 12% ao ano. “A renda caiu, o real desvalorizou e a saúde e a educação não melhoraram. São perguntas difíceis, mas fazê-las ajuda a pensar o que foi tudo isso”, reflete.

Afastamentos e aproximações

“A minha mãe é professora, já se candidatou a prefeita e a deputada e é uma pessoa muito engajada na política. Os meus pais e irmãs são pessoas que comungam ideais políticos comigo”, relata a advogada Manuela Abreu, acrescentando que, desde a eleição disputada em 2014 entre Aécio Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT), ela saiu dos grupos de família com seus tios e avós por ter ficado difícil conciliar.

A advogada de Jacareí (SP), explica que encontrou o seu nicho quando veio para a capital paulista, onde conheceu grupos como o Levante Popular da Juventude, União da Juventude Socialista (UJS), movimentos feministas dentro do Mackenzie e na PUC, entre outros, e a partir daí, entrou de vez para a militância.

Já Choiti Kamikawachi conta que não toma nenhuma atitude quando alguém posta algo contraditório aos seus pensamentos nas redes sociais, a menos que seja provocado. Ele também diz que toma muito cuidado na hora de selecionar seus amigos. Do mesmo modo, o professor Rafael Ozório diz ter criado laços com as pessoas que conheceu.

“Cheguei a morar com alguns amigos que eu conheci através da militância, mantenho boa parte deles até hoje” - Rafael Ozório.

O estudante de história Rodrigo Macedo afirma que nunca brigou por conta de posicionamentos políticos, mas pequenos desentendimentos existiram. Ele conta que quando falavam para ele que o Bolsonaro iria implantar uma ditadura e que armar a população resultaria em mais violência, tentava contra-argumentar e explicava que a mídia era responsável por propagar essas ideias.

Para Macedo, a polarização não é algo bom, pois a divisão ocorre somente em dois lados e os mais moderados não conseguem difundir seus pensamentos. “As pessoas esquecem que existem outros partidos, outras ideias, mas é preciso haver diálogo para se chegar ao meio termo. Essa polarização acaba fazendo mal para a nossa democracia, pois em um cenário saudável todos têm que ser ouvidos”, afirma.

Visão de futuro

“Eu ouvi de cientistas políticos que em momentos de necessidade extrema, o que uma parcela importante da população brasileira pode vir a ter ano que vem são um terreno fértil para revoltas. Quando a pessoa está realmente em urgência o problema é o caos social”, destaca o jornalista José Roberto Castro, complementando que as expectativas para a crise econômica não são positivas, por conta do provável fim do auxílio emergencial concedido pelo governo.

A pandemia está evidenciando as desigualdades sociais e isso, segundo a advogada Manuela Abreu, pode gerar mais polarização, pois as pessoas estão ficando desempregadas e sem dinheiro para as despesas essenciais, como a alimentação. O estudante de história Rodrigo Macedo também concorda com essa visão. “Se a economia não for bem em 2021 e isso afetar as famílias brasileiras, eu acredito que vão ter manifestações sim”, diz.

Reprodução: Gabriela Batista

Conflito versus confronto: a luta do nós contra eles

Por Tifany Kimura

Pluripartidarismo é o que vigora no sistema político brasileiro. Ocorre quando três ou mais partidos políticos assumem o controle de um governo, de modo independente ou por uma coalizão, e concordam em trabalhar em conjunto para atingir uma meta. Em regimes democráticos, juntamente com a atuação dos governantes, a participação do povo é necessária para o pleno exercício da cidadania.

A vitória da ex-presidente Dilma Rousseff em 2014, por uma margem de 3%, evidenciou a polarização política do país. Naquele ano, o sentimento de insatisfação pela alta dos preços dos produtos e serviços e os sucessivos escândalos de corrupção foram responsáveis por acirrar os ânimos da população. Como consequência, em agosto de 2016, Dilma Rousseff sofreu o impeachment que interrompeu seu mandato, confirmando a irritação política dentro e fora do Congresso.

Greves nas ruas e manifestações continuaram quando o até então vice-presidente Michel Temer assumiu o governo. Uma parcela da população se uniu em torno da pauta anticorrupção, com movimentos conservadores alinhados à direita se fortalecendo e dando espaço para a candidatura de Jair Bolsonaro à presidência da República. Em 2018, o resultado da eleição presidencial intensifica ainda mais a divisão política brasileira.

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Créditos: Hoshi

Para Rosinei Naves, mestre em História Econômica pela USP e professora na Universidade São Judas Tadeu (USJT), existe um problema quando os partidos se fecham para o diálogo. “A direita e a esquerda foram seduzidas pelos interesses próprios e não coletivos. Quando essa polarização conduz a sociedade ao fascismo, a desinformação, ao aprofundamento das desigualdades sociais, esse processo pode levar ao autoritarismo”, afirma.

Para que os pólos não interfiram um no outro, segundo Rosinei, é necessário existir uma genuína preocupação entre ambos os lados de não ultrapassarem seus limites. “Não deveria ser um problema viver com pessoas que pensam diferente. Pode não parecer, mas as diferenças são saudáveis. Contudo, todas as ideias e opiniões deveriam ser sustentadas por dados científicos, gostemos ou não”, reflete. Ela acredita que, para dar vazão às diferenças de maneira saudável, as pessoas devem ser educadas a conviver com o contraditório.

Segundo a professora, fazer política é uma característica humana, mas devido a educação deficitária, as pessoas não possuem familiaridade com o tema. “Desde que nascem, as pessoas são levadas a pensar em política como algo estranho, indiferente a elas próprias e não aprendem que política é, na verdade, a arte de administrar o diverso e o adverso”, diz.

Contrastes na prática

À medida que ambos os lados, esquerda e direita, foram lutando por mais espaço, os discursos se inclinaram para uma maior radicalização, nutrindo a polarização política por meio da intensificação das divergências. “Sem conflito a política não existe. Ela faz parte desse ato”, defende a socióloga e pesquisadora de Ciência Política na Unicamp, Ana Claúdia Teixeira. “Na prática, não importa mais o que se está defendendo, mas quem está defendendo”.

Para o professor de filosofia e sociologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Marcos Luciano Carvalho, quando se analisa os acontecimentos políticos que marcaram a história recente do Brasil, fica claro que a direita ainda não possuía grande expressividade. "Durante os mandatos de Fernando Henrique Cardoso, Lula, Dilma e Temer, por exemplo, a direita não era tão forte e a polarização ainda não era tão intensa. A ausência de polarização foi e é danosa",declara.

Os pontos de vista ideológicos influenciam em grande medida o debate brasileiro. Essas duas forças são representadas pelo antagonismo entre direita e esquerda. “Às vezes, o indivíduo tem um pensamento super conservador para algumas coisas e para outras é progressista. Pode ser incoerente, mas isso se deve aos diferentes processos de socialização que ocorrem desde a infância”, explica a socióloga Ana Claúdia.

Destaques na mídia

Se a polarização sempre existiu, mas não era bem expressiva, por que tem ganhado cada vez mais destaque? Uma possível resposta para a questão é o universo digital, que pode propiciar essa tendência. “A grande mídia contribuiu de diversas formas com as manifestações, ajudando na divulgação de data, horário e local dos atos e noticiando pautas, divulgando fotos, fazendo enquetes”, descreve a autora Maria da Glória Marcondes Gohn, em seu livro ‘A Sociedade Brasileira em Movimento’.

Um exemplo são as redes sociais que utilizam algoritmos para definir quais conteúdos chegarão até os usuários e quais postagens se encaixam com as visões de mundo de cada internauta. Nesse cenário, opiniões discordantes podem chegar ao ponto de serem consideradas inaceitáveis. “É irônico o papel das redes sociais, pois a tendência é se fechar e não se abrir para opiniões diferentes. O meio não é propício, as mídias não ajudam, pois os algoritmos calculam para deixar os usuários, muitas vezes, condicionados”, diz Ana Cláudia. Para a socióloga, esse processo cria o efeito de bolhas, resultando na cristalização e fortalecimento das ideias que os indivíduos já possuem.